Normas da União Europeia contribuem para a sustentabilidade dos oceanos;

Ángel Martínez Varela, presidente da Fandicosta, considera
Normas da União Europeia contribuem para a sustentabilidade dos oceanos
A saída do Reino Unido vai-nos afetar”, afirma Ángel Martínez Varela, presidente da Fandicosta.
“O mercado está em constante evolução, com menos produto tradicional e cada vez com mais novos formatos nas casas dos consumidores” – afirma Ángel Martínez Varela. Em entrevista à “Vida Económica”, o presidente da Fandicosta refere que os agregados familiares são cada vez mais pequenos, o que obriga as empresas a ajustar a sua oferta de produtos.
A Fandicosta concluiu o processo de reconstrução das suas instalações em Vigo, tendo aumentado a capacidade de armazenamento para 35 mil toneladas. É uma das maiores empresas da Europa no seu setor e está presente em 34 países, incluindo Portugal.
Vida Económica - Como tem evoluído a atividade da Fandicosta e o seu posicionamento no mercado?
Ángel Martínez Varela - A Fandicosta está na terceira geração. Foi criada por Miguel Martinez Botas, é por isso que uma parte da atividade mantém a designação de Casa Botas. Em 1970 demos um salto para o congelado, o que determinou a expansão da atividade,
Desde o início da comercialização do peixe congelado, passámos a dispor de barcos com palangre, alguns deles são barcos portugueses. Sempre tivemos e continuamos a ter boas ligações com Portugal. Continuamos a vender peixe fresco em Vigo, pescado por navios portugueses.
No mercado do peixe onde atuamos temos três empresas distintas.
Vendemos peixe fresco através de navios fretados, temos venda de produtos congelados e também barcos palangreiros. A nossa empresa desenvolveu a congelação, processamento e transformação de produtos. Com as instalações frigoríficas da Fandicosta em Villagarcia e Vigo, temos 20 mil toneladas de produtos em armazenamento, mas a nossa capacidade atinge as 35 mil toneladas.
Nem todos os produtos que armazenamos são nossos. Também trabalhamos com fábricas de conservas, com outras empresas que utilizam o frio, atuando como depositários de mercadorias nas nossas instalações.
 
VE - Para a atividade da empresa é importante combinar a capacidade de transformação e congelação com os meios de pesca de peixe no mar?
AMV - A Fandicosta tem atualmente cinco navios, estando dois na Argentina, e mais três barcos palangreiros. Além dos barcos próprios, temos acordos comerciais com 70 navios, o que assegura um grande volume de pesca.
 
VE - Existe o risco de o consumo de peixe selvagem aumentar pondo em causa a sustentabilidade das pescas?
AMV - Não, eu acho que hoje em dia os oceanos estão bem regulados. O consumo de peixe também depende cada vez mais da aquicultura, que tem um peso cada vez maior nos recursos marinhos.
Um exemplo que temos diante de nós na Ria de Vigo é a produção de mexilhões. Mas a aquicultura permite produzir uma grande variedade de espécies, como o salmão. sargo, robalo, peixe-gato, dourada. A produção de peixe em aquicultura tem crescido muito, especialmente na Ásia.
Em relação à pesca de peixe selvagem, o que tem sido bem feito nos últimos anos é a delimitação dos pesqueiros, avaliando as quantidades de peixe que estão no mar, em cada área de pesca e definindo os volumes de pesca possíveis. Isso é cada vez mais credível, e é rigorosamente aplicado. Como acontece em todos os negócios, podem existir piratas. Mas serão cada vez menos. As regras da União Europeia evitam que tal possa acontecer.
A nossa empresa está sujeita a obrigações de declaração de desembarque. Tem um regime de entreposto aduaneiro. Um navio de outra bandeira pode colocar produtos nas nossas instalações sem entrar formalmente em Espanha. Mas exigimos garantias, porque, se existir algum problema, como divergência nas quantidades ou nas espécies, somos nós os responsáveis. Por isso há muito controlo. Há um fator de incerteza que decorre do “Brexit” porque existem bastantes navios, especialmente navios de lula espanhóis, que trabalham nas Ilhas Malvinas. A saída do Reino Unido vai-nos afetar porque não sabemos se os barcos espanhóis vão poder continuar a pescar, e em que condições, na zona das Malvinas.
 
Nova fase depois do incêndio
 
VE - Está concluído o processo de reconstrução das instalações que foram atingidas pelo incêndio há três anos atrás?
AMV - O incêndio de 2016 foi trágico para a nossa empresa tendo destruído cerca de 60% das instalações e provocado prejuízos de 52 milhões de euros. Ao ficar completamente queimada a câmara frigorífica, perderam-se 9000 toneladas de produtos, no valor de 12 milhões de euros em mercadoria dos clientes, 15 milhões de euros em mercadorias da empresa, e instalações com um valor de 25 milhões de euros.
Além das câmaras frigoríficas, perdemos uma fábrica moderna, perdemos os escritórios com os dados da nossa empresa.
 
VE - Quais foram as maiores dificuldades que enfrentaram?
AMV - Além da perda dos produtos fomos confrontados com os escombros e com nove milhões de quilos de peixe a deteriorar-se, junto à Ria de Vigo, o que seria uma ameaça à saúde pública. Para remover os produtos foram necessários 700 camiões entre Vigo e Lugo, onde era possível eliminar 400 toneladas por dia de produtos orgânicos. Para remover os escombros e a mercadoria tivemos um custo de três milhões de euros.
A seguir surgiu um obstáculo administrativo. As instalações que foram consumidas pelo incêndio datavam de 1996. Como o plano de urbanização da zona de Moaña estava suspenso, as autoridades locais não queriam renovar as autorizações para a construção.
Estamos no final deste processo e no início de uma nova fase. A nova câmara frigorífica que fizemos é muito moderna e, em vez da capacidade anterior de 9000 toneladas, aumentámos para 15 000 toneladas. Mas estes três anos foram muito difíceis, a lutar com as companhias de seguros, com os políticos, e com uma capacidade de produção reduzida.
VE - A empresa já recuperou a rentabilidade que tinha antes do sinistro?
AMV - Este ano, ainda perdemos dinheiro, obviamente. Estivemos a trabalhar em condições piores, sem uma grande parte das câmaras frigoríficas. A reconstrução terminou em setembro 2018. As instalações são muito modernas, mas verificamos que colocar os novos equipamentos em plena capacidade é mais difícil porque quase tudo é automatizado. Os filetes de peixe são cortados, embalados, lacrados e colocados em caixas, sendo carregados nos camiões de forma totalmente automatizada.
Ao ser extremamente automatizado, o processo leva muito tempo para a parametrizar, e é mais sensível a qualquer variação na espessura do propileno da embalagem ou alteração das caixas onde é colocado.
O incêndio foi o maior problema com que me deparei na minha vida e é um problema que ainda hoje não passou, mesmo tendo cobertura de seguro. No dia seguinte ao sinistro, a seguradora assume o papel de inimigo. É uma luta que dura anos.
 
Mercado em constante evolução
 
VE - O mercado do peixe fresco e congelado tem bastantes inovações e novos produtos?
AMV - Sim, é um mercado que está em constante evolução, com menos produto tradicional e cada vez com mais novos formatos nas casas dos consumidores. Nós exportamos uma grande quantidade de peixe para os Estados Unidos e foi um choque para mim constatar nos anos 80 que a forma de consumir era completamente diferente. Pensei que as diferenças se iriam manter, mas hoje já estamos muito próximos dos formatos do mercado norte-americano.
Por exemplo, na Catalunha, cerca de 1/4 do peixe congelado que se consome são doses individuais, o que obriga a ter um formato muito especial, com duas unidades. O número de pessoas por agregado familiar mudou radicalmente a nossa forma de consumir. Eu diria que o modelo de família mudou. De facto, as famílias são menores em número de crianças, e há cada vez menos famílias com quatro ou cinco pessoas.
 
VE - Perante uma grande diversidade de produtos e origens de peixe congelado quais são os erros mais comuns dos consumidores?
AMV - É iludirem-se com o preço e não atender à qualidade do produto.

A Fandicosta em números
 
Capacidade de produção: 150 000 kg/dia
Diariamente são produzidos
1 000 000 de anéis de pota
115 000 filetes de pescada
35 000 postas de peixe espada
24 000 bifes de atum
40 000 ton/ano de peixe selvagem e marisco
Presença em 34 países e mais de         25 000 retalhistas na Europa
Espanha: 11 895 retalhistas
França: 9343 retalhistas
Itália: 3606 retalhistas
Portugal: 949 retalhistas

 


Susana Almeida, 25/07/2019
Partilhar
Comentários 0