A Informação Empresarial Simplificada e as reestruturações empresariais: uma síntese
1 Introdução
O presente texto visa apresentar os traços essenciais da Informação Empresarial Simplificada(IES) e identificar as informações que esta solicita ao sujeito passivo no âmbito de uma reestruturação empresarial, designadamente a fusão. O processo de fusão constitui um instrumento de reestruturação ou reorganização empresarial, a par, entre outros, da cisão, da entrada de ativos e da permuta de partes sociais.
O artigo está organizado em quatro secções. Após esta breve introdução, a segunda secção expõe as características principais da IES, a terceira parte regista a relação que se estabelece entre a IES e as informações a prestar no contexto de um processo de fusão e termina-se com a quarta secção, a relativa à conclusão.
O presente texto visa apresentar os traços essenciais da Informação Empresarial Simplificada(IES) e identificar as informações que esta solicita ao sujeito passivo no âmbito de uma reestruturação empresarial, designadamente a fusão. O processo de fusão constitui um instrumento de reestruturação ou reorganização empresarial, a par, entre outros, da cisão, da entrada de ativos e da permuta de partes sociais.
O artigo está organizado em quatro secções. Após esta breve introdução, a segunda secção expõe as características principais da IES, a terceira parte regista a relação que se estabelece entre a IES e as informações a prestar no contexto de um processo de fusão e termina-se com a quarta secção, a relativa à conclusão.
2 O essencial sobre a IES
Como é do conhecimento geral, o XVII Governo Constitucional criou, em 2007, por intermédio do Decreto-Lei n.º 8/2007, de 17 de janeiro, uma obrigação declarativa anual denominada Informação Empresarial Simplificada, a qual atualmente consiste na prestação de informação de natureza fiscal, contabilística e estatística, através de uma declaração única transmitida por via eletrónicaapresentada anualmente até ao 15.º dia do 7.º mês posterior à data do termo do exercício económico. A iniciativa legislativa associada à IES surgiu no âmbito do Simplex, um programa de simplificação administrativa lançado pelo Governo em 2006, que visava tornar mais fácil a vida dos cidadãos e das empresas na sua relação com o Estado.O diploma base do ano de 2007 permanece em vigor, tendo sido objeto de várias atualizações posteriores.
A introdução da IES no ordenamento jurídico-contabilístico nacional foi motivada essencialmente por dois propósitos: transparência e simplificação (Ferreira, 2021). Com efeito, malgrado as atuais críticas dos profissionais de contabilidade à excessiva extensão e complexidade do documento[1], a IES, na sua génese, surgiu com o objetivo de fomentar a transparência entre as entidades e a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), bem como reunir, num só local, todas as informações contabilísticas, fiscais e estatísticas relevantes da atividade económica dos sujeitos passivos (Ferreira, 2021).
No que tange ao âmbito de aplicação, são as seguintes as principais obrigações legais compreendidas na IES, como estabelecido no artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 8/2007, de 17 de janeiro:
- a entrega da declaração anual de informação contabilística e fiscal prevista no n.º 1 do artigo 113.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), quando respeite a pessoas singulares titulares de Estabelecimentos Individuais de Responsabilidade Limitada (EIRL);
- a entrega da declaração anual de informação contabilística e fiscal prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 117.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC);
- o registo da prestação de contas, nos termos previstos na legislação do registo comercial;
- a prestação de informação de natureza estatística ao INE;
- a prestação de informação relativa a dados contabilísticos anuais para fins estatísticos ao Banco de Portugal (BdP); e, por último,
- a prestação de informação de natureza estatística à Direção-Geral das Atividades Económicas (DGAE).
Como se antevê, os destinatários da IES aparecem desde logo referenciados na sua folha de rosto, a saber, a AT, o Instituto dos Registos e do Notariado (IRN), o INE, o BdP e a DGAE. A IES é dos elementos mais requeridos por entidades externas, como é o caso dos bancos (Basto, 2021), quando estes últimos procedem à avaliação do risco de crédito associado ao financiamento a conceder às empresas e aos empresários.
Diretamente relacionada com a obrigação do registo da prestação de contas atrás exposta, vem ao caso mencionar a observação de que o reconhecimento contabilístico do custo do registo daprestação de contas (no valor de 80,00 €, acrescente-se), deverá, salvo melhor opinião, ser reconhecido na conta “6265 Fornecimentos e Serviços Externos – Serviços Diversos – Contencioso e Notariado”, por se estar na presença de um encargojunto daConservatória do Registo Comercial.
Quanto ao mais, a entrega da declaração é realizada pelo contabilista certificado no portal das finanças ou através do sistema webservice IES, tendo a empresa cinco dias úteis para efetuar o pagamento.A submissão dos dados da prestação de contas gera automaticamente uma referência multibanco para pagamento do registo de prestação de contas obrigatório, o qual, como se escreveu, tem atualmente um custo de 80,00 €.Caso a IES não seja entregue ou o pagamento seja efetuado fora do prazo convencionado, a entidade estará sujeita a um processo de contraordenação comcoimas previstas na legislação fiscal, na legislação do registo comercial e na legislação do sistema estatístico nacional (Costa, 2021).
A IES é composta por um conjunto alargado de anexos, a preencher em conformidade com o normativo contabilístico que tenha sido adotado pelas empresas no período a que respeita, de acordo com o definido no Decreto-Lei n.º 98/2015, de 2 de junho (Sistema de Normalização Contabilística) (SNC) (Neves e Lagos, 2021). Deste modo, o sujeito passivo deverá indicar, na folha de rosto do Anexo A, a tipologia de contabilidade utilizada pela entidade: Normas Internacionais de Contabilidade (NIC); Normas Contabilísticas e de Relato Financeiro (NCRF) do SNC-Geral; Norma Contabilística e de Relato Financeiro para Pequenas Entidades (NCRF-PE); ou Norma Contabilística para Microentidades (NC-ME).
É importante assinalar que a IES é obrigatória para todas as empresas e empresários com contabilidade organizada. No polo oposto,segundo Basto (2021),estão dispensadas da obrigatoriedade de entrega da IES, entre outras, as entidades que não estão sujeitas ao registo da prestação de contas, como sejam, as associações, as fundações, as cooperativas, os agrupamentos complementares de empresas,os agrupamentoseuropeus de interesse económico, e os empresários em nome individual que não estejam obrigados a ter contabilidade organizada e que não tenham liquidado imposto do selo.
Em fecho, remete-se o leitor para a Coleção Essencial 2022 da Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC) relativa ao preenchimento da declaração IES, um manual de 403 páginas disponível eletronicamente no sítio da OCC (cf. Carrapiço, 2022).
3 A IES e as reestruturações empresariais: o caso da fusão
O Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC) prevê, desde a sua publicação, um regime especial de neutralidade fiscal aplicável a alguns tipos de reestruturações empresariais. Como se refere no preâmbulo do CIRC, a reorganização e o fortalecimento do tecido empresarial não devem ser dificultados, mas antes incentivados. Assim, o legislador regulamentou aquelas operações para que não encontrem qualquer obstáculo fiscal à sua efetivação,desde que esteja garantido,pela forma como se processam,que apenas visam um adequado redimensionamento das unidades económicas. Atualmente, as operações abrangidas são as fusões, as cisões, as entradas de ativos e as permutas de partes sociais, cujo regime especial vem consagrado nos artigos 73.º a 78.º do CIRC.
Em síntese, o regime caracteriza-se pela não consideração dos efeitos fiscais derivados das transferências dos elementos patrimoniais pertencentes às sociedades e sócios envolvidos nas operações, sendo os resultados apurados posteriormente, na esfera das sociedades beneficiárias, em atenção ao princípio da continuidade empresarial (Mendes, 2016). O legislador procurou o equilíbrio difícil, mas necessário, de não introduzir entraves fiscais à realização de operações motivadas por razões económicas válidas e, em simultâneo, de evitar o incentivo de natureza fiscal a estas operações que pudessem introduzir distorções na concorrência. Trata-se de um regime especial opcional baseado na neutralidade concretizada no diferimento do imposto.
Associado a este regime encontram-se obrigações acessórias especiais previstas no artigo 78.º do CIRC. A opção pelo regime especial efetiva-se na comunicação à ATda declaração anual de informação contabilística e fiscal, a que se refere o artigo 121.º do CIRC, relativa ao período de tributação em que a operação é realizada. Concretamente, a folha de rosto da IES, no quadro 10 – Acontecimentos marcantes–, prevê a indicação, por cada tipo de operação de reestruturação abrangida, de um conjunto de informações atinentes às operações em causa. Para além de permitir a opção pelo regime especial, pretende-se recolher informações referentes a acontecimentos marcantes verificados no período económico, ou seja, acontecimentos com efeitos na estrutura da entidade ou que tenham afetado a comparabilidade dos dados da entidade entre períodos económicos.
Atente-se, para o caso da fusão, o âmbito real e pessoal das informações solicitadas (cf. Marques, 2020).A fusão opera-se através da transferência global do património de uma ou mais sociedades para outra e a atribuição aos sócios daquelas de partes, ações ou quotas desta, havendo outras variantes aqui não tratadas. O n.º 1 do artigo 78.º do CIRC faz impender a obrigação declarativa referente à opção pelo regime especial de neutralidade sobre a ou as sociedades beneficiárias (uma ou várias recetoras da universalidade do património da ou das sociedades fundidas). No entanto, as instruções da IES ao quadro 10 vão além do previsto naquela disposição, abrangendo a comunicação pela opção a “todas as entidades intervenientes na fusão”. Por outro lado, é necessário identificar a “Entidade Origem” e a “Entidade Destino” com os respetivos Números de Identificação Fiscal (NIF).
Nos casos de as sociedades beneficiárias e/ou das sociedades transmitentes não serem residentes em território português nem disporem de estabelecimento estável aí situado, a obrigação de comunicação deve ser cumprida pelos sócios residentes.
Ainda que as operações de reestruturação não sejam efetuadas ao abrigo do regime de neutralidade fiscal previsto no CIRC, a obrigação declarativa de comunicação e identificação das entidades intervenientes nas mesmas, através da IES, subsiste.
Para além da obrigação declarativa aqui tratada, outras há previstas no referido artigo 78.º do CIRC merecedoras de atenção por parte das entidades intervenientes nas operações de reorganização empresarial, nomeadamente no que concerne aos elementos de suporte das operações a integrar no processo de documentação fiscal (Ramalho, 2015).
4 Conclusão
O artigo descreveu sumariamente a origem da IES, os seus principais destinatários e a sua ligação aos processos de reestruturação de empresas, focando-se em especial na fusão.
A IES revela-se um documento de suma importância na prestação de informações contabilísticas, fiscais e estatísticas à AT, ao IRN, ao INE, ao BdP e à DGAE. A complexidade das informações recolhidas leva a que muitos contabilistas certificados a considerem demasiado extensa e trabalhosa, pese embora consigam agora dar resposta às necessidades de informação de 5 entidades por transmissão num único momento e perante uma única entidade pública, contrariamente ao que sucedia antes de 2007.
As demonstrações financeiras (DF) preparadas e apresentadas através da IES não substituem a preparação e apresentação do conjunto de demonstrações financeiras previstas no SNC. Assim mesmo se expressou em 2017 a Comissão de Normalização Contabilística (cf. resposta à Questão Frequente n.º 19), fundamentando-se na circunstância de serem diferentes a quantidade e o detalhe das informações exigidas para essas duas finalidades (IES e SNC). Dito de forma mais simples: as DF que devem ser aprovadas pelo órgão de gestão e disponibilizadas aos sócios/acionistas para deliberação em assembleia geral são as elencadas no artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 158/2009, de 13 de julho, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º 98/2015, de 2 de junho (conjunto de DF previstas no SNC).
Este texto abre portas a novas oportunidades de investigação, de que constituem exemplos estudos quantitativos que possam aferir qual o tempo de trabalho que os contabilistas certificados dedicam à IES, em termos médios, consoante os diferentes normativos contabilísticos utilizados pelas entidades a quem prestam serviços no exercício da sua atividade profissional como profissionais independentes.
Referências citadas
Basto, F. X. (2021). “Obrigatoriedade de entrega da IES”. Revista Contabilidade & Empresas 69, pp. 28-29.
Carrapiço, J. (2022). Preenchimento da Declaração IES e Taxonomias. Lisboa: Ordem dos Contabilistas Certificados.
Cipriano, I. (2021). “A IES e a ‘Exactidão das Contas por Direito Certo’”. Revista Contabilidade & Empresas 69, pp. 19-20.
Costa, A. (2021). “Informação Empresarial Simplificada”. Revista Contabilidade & Empresas 69, pp. 8-9.
Ferreira, R. F. (2021). “Contribuinte deve saber como é utilizada a informação contida na IES”. Entrevista feita pelaContabilidade & Empresasa Rogério Fernandes Ferreira. Contabilidade & Empresas 69, pp. 5-7.
Marques, R. (2020). Código do IRC – Anotado e Comentado (2.ª ed.). Coimbra: Almedina.
Mendes, A. R. (2016). IRC e as Reorganizações Empresariais. Lisboa: Universidade Católica Editora.
Neves, C. B., e Lagos, B. (2021). “IES/DA: Informação Empresarial Simplificada/Declaração Anual de Informação Contabilística e Fiscal”. Revista Contabilidade & Empresas 69, pp. 16-18.
Ramalho, J. M. (2015). O Regime de Neutralidade Fiscal nas Operações de Fusão, Cisão, Entrada de Ativos e Permuta de Partes Sociais – Comentários ao Código do IRC. Coimbra: Coimbra Editora.
Legislação citada
— Código do IRC (versão à data de 16 de maio de 2022).
—Decreto-Lei n.º 8/2007, de 17 de janeiro – Criação da IES.
—Decreto-Lei n.º 158/2009, de 13 de julho, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º 98/2015, de 2 de junho (SNC).
[1]Veja-se, neste sentido, Cipriano (2021), ao salientar que, além da folha de rosto, a IES abrange mais 18 anexos, sendo que só um deles comporta adicionalmente 55 páginas, que correspondem a mais de 2600 campos de informação. Cipriano (2021) também faz notar que, à margem da IES, as entidades públicas (como, por exemplo, o Instituto Nacional de Estatística (INE)), continuam a solicitar informações adicionais às empresas, o que, no seu entendimento, compromete o objetivo de simplificação anunciado no ano de 2007.