Crise energética na Europa;

Aumento dos preços do gás natural e da eletricidade pressiona economia europeia
Crise energética na Europa
Por analistas XTB

Parece quase certo que a Europa está a caminhar para a maior crise energética da história. Os países europeus tornaram-se dependentes das importações de energia de países não comunitários, especialmente da Rússia, e negligenciaram a diversificação do abastecimento e as suas próprias capacidades de produção. O gás barato tornou a economia europeia mais competitiva e permitiu o lançamento da transição energética. Contudo, torna-se cada vez mais claro que as fontes de energia alternativas não conseguirão compensar o défice de produção de eletricidade a partir de fontes mais tradicionais. Os embargos e “penalizações” pela utilização de fontes de energia com emissões elevadas estão a afetar a competitividade europeia e podem empurrar a Europa para uma profunda recessão.
As instalações de armazenamento estão cheias mas as entregas continuam a ser um problema

O gás natural foi uma das commodities energéticas mais baratas para a Europa ao longo de vários anos, uma vez que corresponde a 40% das importações provenientes da Rússia. A Europa também tinha acordos de fornecimento com outros países, incluindo os Estados Unidos, mas o gás da Rússia era o mais barato. É por isso que a redução das exportações de gás russo para a Europa, para apenas 20% dos níveis anteriores à guerra, e o risco de paragem total dos fornecimentos está a provocar aumentos gigantescos dos preços. Os preços do gás natural situavam-se abaixo dos 30 euros/MWh antes da pandemia de Covid, mas agora são cerca de 10 vezes superiores.
Os inventários europeus de gás natural estão quase a 80% da capacidade total. Isto significa que estão mais cheios do que estavam em qualquer ponto de 2021. Mas porque motivo é que os mercados estão tão preocupados com o fornecimento e porque é que os preços são tão elevados? Os atuais níveis de inventário irão durar dois meses de consumo, considerando uma paragem completa das entregas. Se todos esses inventários forem utilizados agora não haverá gás para as empresas operarem no verão de 2023 e o inverno de2023 será muito pior do que o de 2022.

Quais são os países mais expostos
a esta situação?

A competitividade da Europa está a ser prejudicada pelo aumento maciço dos preços das matérias-primas energéticas. Os preços da energia para entrega imediata, bem como para entrega com um ano de antecedência, aumentaram várias vezes em comparação com os níveis de um ano atrás. Os termos de troca para o euro ou outras moedas europeias situam-se nos piores níveis da história. Um grande salto nos preços de importação, em comparação com os preços de exportação, é um cenário inflacionário que pode levar a um aumento mais rápido das taxas de juro e, por conseguinte, ter um impacto negativo na atividade económica.
O impacto pode ser maior para alguns setores da economia europeia do que para os outros. É claro que as empresas de energia utilizam a maior parte do gás natural, mas as empresas químicas, refinarias e fábricas de papel são também grandes consumidores. Não se pode descartar que as empresas comecem a diminuir a produção ou mesmo a suspendê-la completamente em resposta aos preços altíssimos do gás.

Existem fontes de energia alternativas?

O gás natural era e continua a ser a fonte de energia preferida na União Europeia na sua busca de se tornar totalmente independente dos combustíveis fósseis. No entanto, a produção de eletricidade a partir do carvão ou mesmo de centrais nucleares é mais barata, tendo em conta os preços atuais do gás natural. O problema é a relutância em reiniciar centrais elétricas a carvão, mesmo porque este tipo de produção é três vezes mais barata. No entanto, há alguma mudança nesta frente - a Alemanha decidiu reiniciar as centrais elétricas a carvão a lignite, enquanto a Suécia começou a gerar energia a partir da combustão de petróleo. No entanto, isto pode não ser suficiente para evitar problemas de abastecimento, mesmo que os planos para suspender temporariamente o comércio de emissões avancem.
Um aumento da produção de energia a partir do carvão ou utilização de petróleo  significa que as licenças de CO2 deverão também valorizar. Os preços EMISS baixaram recentemente, mas está previsto para dezembro um número relativamente pequeno de leilões, o que poderá ver EMISS saltar acima dos 100 euros por contrato. Fonte: xStation5

E o gás natural dos EUA?

Os Estados Unidos estão seguros quando se trata de energia. O país não só está a utilizar os seus próprios recursos como também é um exportador líquido de produtos energéticos. Os preços europeus do gás são oito vezes mais altos do que nos Estados Unidos, enquanto que os preços da eletricidade são 4-6 vezes mais altos. Em teoria, existe um grande incentivo económico para impulsionar as exportações para a Europa. No entanto, a infraestrutura é um problema. Se a Europa se ater aos planos de isolar a Rússia e decidir manter o regime de comércio de emissões em vigor, a procura de gás natural dos EUA poderá continuar a aumentar.
As reservas de gás natural dos EUA são relativamente baixas em comparação com uma média de cinco anos. No entanto, olhando para os últimos 10 anos, a situação não é assim tão má. Não devemos esperar uma queda na procura interna e a procura externa continuará a crescer. Dito isto, pode-se supor que um período de preços baixos do gás natural tenha terminado.
Diferenças entre os inventários atuais dos EUA e a média de 5 anos em comparação com os preços atuais do gás natural dos EUA. Os preços podem permanecer em níveis elevados, uma vez que existe pressão para aumentar as exportações e expetativas de uma procura interna forte e contínua. Fonte: Bloomberg

Há alguma hipótese de melhoria?

A pandemia demonstrou que a procura de certos produtos pode ser grandemente reduzida a curto prazo se as circunstâncias o exigirem. A procura de petróleo diminuiu até 25% devido à pandemia. Os consumidores não devem ter medo da falta de calor, mas devem estar prontos para pagar preços mais elevados. Por outro lado, a vontade de reduzir o consumo de gás, por si só, atuará no sentido de reduzir a procura. Não há escassez de mercadorias no mundo, mas é pouco provável que a situação melhore antes do inverno, devido à falta de investimentos adequados nos últimos anos. Contudo, há uma hipótese de que ações conjuntas empreendidas pelos países europeus e um consumo mais equilibrado ajudem a melhorar a situação nos próximos anos.


Susana Almeida, 01/09/2022
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