Multicloud é uma forma mais madura de estar na nuvem;

Multicloud é uma forma mais madura de estar na nuvem
Já havia a cloud privada, a cloud híbrida e agora temos a multicloud, na qual as empresas lidam com vários fornecedores de nuvem. Os especialistas dizem que esta é uma abordagem mais madura à cloud. Quais os desafios e que complexidade existe em lidar com múltiplos providers?
A multicloud é ‘sexy’, ‘atraente’, ‘simpática’ e ‘apetecível’. Estes não são adjetivos que estejamos particularmente habituados a ver ligados a temas tecnológicos, mas a verdade é que aconteceu. E não é propriamente complicado entender o porquê: se há algo que, pelo menos em teoria, torna os negócios mais ágeis, flexíveis, com um maior controlo de custos e capazes de se adaptarem às necessidades do mercado, não é atraente? É. A questão é que, quando a esmola é grande, o santo não costuma desconfiar? Costuma.
Comecemos pela definição de multicloud. Através desta abordagem, as empresas podem executar as suas aplicações e cargas de trabalho – que em Portugal os intervenientes neste mercado mantêm o nome inglês workloads – em qualquer ambiente de cloud que faça mais sentido do ponto de vista de custo, desempenho ou funcionalidade em determinado momento. Ou seja, multicloud é basicamente uma abordagem composta por mais de um serviço e de um fornecedor de cloud, seja ela pública, privada ou híbrida. De acordo com a IDC, até 2021, 90% das empresas irão adotar ferramentas e estratégias integradas de multicloud híbridas para suportar diferentes aplicações e diferentes casos de uso.
 
Uma arquitetura de base
 
Para as empresas que estão agora a começar a sua jornada para a cloud pode ser tentador selecionar apenas um fornecedor e tentar mover todos os seus sistemas para lá. Mas, diz Paulo Coelho, diretor de multicloud services da IBM, gerir ambientes com um único fornecedor de cloud, não é, por si só, suficiente para eliminar a complexidade da mudança para a nuvem. “Se a escolha de um único fornecedor contemplar soluções mistas de infrastructure-as-a-service (IaaS), platform-as-a-service (PaaS) e software-as-a-service (SaaS), cada uma destas ofertas pode ainda ter que ser gerida separadamente. Além disso, as empresas correm o risco de serem ultrapassadas pelos seus concorrentes de negócio que optam por escolher as plataformas que melhor se adaptam às suas necessidades, disponibilizadas por diferentes fornecedores de cloud”. 
O conceito de multicloud é, precisamente, fazer com que cliente possa optar por diferentes fornecedores para assim garantir que tem “o melhor dos dois mundos”, esclarece este responsável. Na verdade, Paulo Coelho diz que os clientes já estão ligados a vários fornecedores, “tem é de haver uma base de arquitetura que permita que tudo seja integrado”.
A IBM prevê que nos próximos dois anos as empresas estejam ligadas, no mínimo, a três fornecedores de cloud. “Os clientes acedem a diferentes aplicações de diferentes sistemas, em diferentes plataformas, que são o ‘best of the best’, e isso é garantido por esta capacidade multicloud numa arquitetura que seja desenhada de base com capacidade de interligar”.
 
Portugal à frente
 
Isabel Reis, diretora-geral do negócio de grandes empresas da Dell para a Ibéria, conhece desde ‘sempre’ o mercado nacional de TI mas também o espanhol. Relativamente à adoção da multicloud, que de resto todos os intervenientes classificam como uma abordagem mais ‘madura’ à nuvem, a executiva diz que Portugal está um pouco à frente do país vizinho, “provavelmente devido à dimensão do mercado e às empresas portuguesas”. E dá um exemplo: “No segmento entreprise, temos empresas com escritórios fora de Espanha, o que torna as coisas um pouco mais complexas. O Santander, por exemplo, quando implementa uma estratégia de multicloud, tem de ter em conta não só os aspetos legais dos países onde tem os bancos abertos, mas as regras específicas do sector. É claro que em Portugal também se verificam essas situações, mas a grande maioria das organizações terá uma realidade um pouco diferente, o que lhes confere mais agilidade. Do que tenho visto pelos nossos clientes, Portugal, na generalidade, está um pouco mais à frente de outros mercados”. 
De resto, a banca é muitas vezes dada como exemplo. Sendo um setor que já coloca muita coisa na cloud, é verdade que ainda tem uma estratégia de nuvem interna e híbrida. “Classicamente, é um setor que tem algumas coisas na cloud pública, mas são mais workloads de ambientes de teste, aplicações muito pouco críticas, até porque a carga normativa relativamente à banca é muito pesada”. Ou seja, a estratégia da banca na cloud é uma realidade, está a acontecer, mas obviamente ainda muito híbrida e on-premise. “Quanto às outras indústrias, não conheço um único cliente que não tenha workloads na cloud. Até já temos clientes que utilizam a cloud para fazer pelo menos um segundo repositório de informação em relação ao que têm on-premise”.
 
A maturidade da multicloud
 
Um cliente ser multicloud mostra um pouco a sua maturidade para com a cloud pública, disse Paulo Vieira, sales manager para Portugal da Palo Alto Networks. “O que quero dizer com isto é que tipicamente, quando vemos um cliente apenas com Azur, AWS ou Google Cloud, quer dizer que ainda não está realmente a expandir-se para a cloud. Mas quando um cliente começa a abordar a multicloud, quer dizer que já tem um nível de maturidade grande, não coloca todos os ovos no mesmo cesto e usa as melhores potencialidades de cada cloud para tirar os benefícios para a sua nuvem”. 
No entanto, Paulo Vieira relembra a necessidade de as empresas criarem uma política de segurança única e transversal a todas as clouds. “Tem de haver uma política que controle os ‘developers’ de cometerem erros e colocarem equipamentos expostos para a internet sem segurança, há que garantir que existem uma série de parâmetros de controlo para não haver problemas de segurança e erros de configuração”. 
Na Palo Alto, a multicloud é, hoje, uma área de negócio com muito sucesso e altamente solicitada não só no mercado internacional, mas também no mercado português. “Esta é a vertente onde estamos a entrar mais forte”. A abordagem é sempre tirar as melhores potencialidades que cada uma das clouds pode trazer às infraestruturas dos clientes. Porque a Microsoft é mais forte numas componentes, enquanto a AWS será em outra componente”. 
Para futuro, Paulo Vieira vê um forte potencial de crescimento. “Temos assistido a uma mudança radical no discurso dos clientes. A capacidade de uma empresa colocar algo na cloud e depois ser capaz de rapidamente mudar a estratégia e ajustar a sua capacidade torna a cloud deveras interessante. Esta capacidade de reagir é o que torna a nuvem tão apetecível e simpática”.
Mas a cloud não é mais barata do que os outros sistemas, diz claramente Paulo Vieira. “E se lhe disserem que é mais barata, estão a mentir-lhe”. O que é, sim, é mais ágil. O que a torna, no entender deste responsável, particularmente “sexy”. E exemplifica: “Hoje, o meu negócio tem vinte mil pedidos. Amanhã, que é Natal, passa para três milhões. A capacidade da cloud de se expandir e aguentar com essa carga e habilitar o negócio e depois voltar a encolher a seguir ao Natal é o que torna a cloud sexy e mágica”.
 
Riscos de integridade
 
Uma coisa parece certa: quer fornecedores quer analistas garantem que cada vez mais organizações vão adotar uma estratégia multicloud para acelerar os seus objetivos de transformação digital, apregoando haver claras vantagens empresariais em adotar uma abordagem deste género. No entanto, também assumem que lidar com múltiplos fornecedores tem o potencial de criar silos cloud dispersos, cada qual exigindo uma perspetiva de segurança individual. Isto aumenta a complexidade da gestão de qualquer postura de cibersegurança corporativa para além de introduzir possíveis inconsistências na aplicação de controlos de segurança e causar uma falta de visibilidade, ou uma visibilidade deficiente, a uma plataforma dinâmica de ameaças híbridas.
A Fujitsu, por exemplo, defende, num documento, que estes desafios de segurança, a par do desenvolvimento de ataques avançados por parte de cibercriminosos, apresentam um risco cada vez maior para a integridade financeira e para a reputação de qualquer negócio. Diz a empresa que tal contribuirá para a ascensão do que denominam de multicloud segura – uma estrutura de segurança integrada capaz de garantir segurança de forma consistente num ambiente múltiplos serviços e fornecedores de nuvem. Esta estrutura, diz a Fujitsu, é apoiada por ferramentas de segurança, automatização e orquestração independentes da cloud e altamente integradas, de modo a fornecer uma visão holística da postura de cibersegurança corporativa, maior visibilidade de segurança e uma aplicação flexível de controlos de segurança relevantes.
Alexandre Janeiro, arquiteto de soluções multicloud da Fujitsu, diz que as razões pelas quais as empresas avançam para a multicloud prenderem-se com a capacidade, a utilização de diferentes funcionalidades ou serviços, a questão da localização geográfica, da jurisdição dos dados ou até mesmo da resiliência dos workloads e flexibilidade na escolha dos fornecedores. “Temos assistido a um interesse por parte das grandes empresas, de resto tipicamente os clientes com os quais a Fujitsu opera, numa estratégia balanceada da cloud privada com os múltiplos serviços de cloud pública. E estamos só a afalar do IasS. Mas quando falamos de PaaS e, sobretudo, SaaS, a complexidade aumenta. A capacidade de escolha é enorme, o ecossistema está em constante evolução” e para nós tudo isto.
Tal como outros fornecedores já tinham comentado, também Samuel Pires diz que a maioria dos clientes já têm, de uma forma ou outra, ambiente multicloud. “É um mercado que tem vindo a amadurecer, mas ainda existem alguns desafios na adoção e arquitetura de estratégias multicloud”. Alguns desses desafios serão a escassez de conhecimentos e recursos especializados em determinados domínios tecnológicos, o desafio da segurança e a gestão das identidades, para aliem da inevitável questão da portabilidade dos ambientes.
SUSANA MARVÃO s.marvao@vidaeconomica.pt, 04/07/2019
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