Do cerejo ao castanho, com mais ou menos máscara, mais ou menos gel, mais ou menos (por vezes muito menos) distanciamento social, a vida foi correndo de feição; as esplanadas permitiram aumentar a capacidade dos estabelecimentos de restauração, o bom tempo proporcionou diversas atividades outdoor, a interrupção das atividades escolares e laborais foi permitindo ir para fora cá dentro, aliviando assim, dessa forma, o stress e a ansiedade não só da população em geral, mas principalmente dos operadores ligados aos ramos do turismo, hotelaria e restauração. E digo aliviando, pois, o impacto das medidas impostas devido à situação provocada pela covid-19 foi devastador. No mês de julho registou-se uma variação negativa de 70,5% nas receitas de aposento, relativamente ao mesmo período do ano anterior (Turismo em números, Turismo de Portugal, I.P., 2020).
Neste contexto, apela-se à resiliência do setor, com a esperança de que em meados de 2021 será retomada uma trajetória de crescimento. E até lá? Quais as empresas que aguentam esperar até 2021? E os efeitos dos prejuízos acumulados?
Do castanho ao cerejo, o cenário muda de figura. Para pior! O regresso às rotinas familiares, o início de mais um ano letivo, desta vez recheado de incertezas, tantos hábitos novos e a fruta da época, claro está! Quem não vai olhar à sua volta sempre que precisar de tossir?
Este artigo não pretende ser um arauto da desgraça, muito pelo contrário. É antes um enaltecer da nossa capacidade enquanto sociedade de reinventar soluções e de criar oportunidades. As necessidades mudaram. Este é o momento de procurar nichos de mercado. Seja pela via da alimentação saudável que fortalece o sistema imunitário, seja pelas novas tecnologias ao serviço da educação ou então criando soluções para um turismo mais sustentável, afastando-se definitivamente do conceito de massificação do século passado.
A promoção do turismo interno e das escapadinhas de fim de semana pode ajudar a mitigar os efeitos negativos desta crise. Diminuir as assimetrias regionais é uma das metas da Estratégia para o Turismo 2027. Em 2019, as dormidas nas áreas costeiras representaram 84,2% do total nacional, contrastando desta forma com 15,8% das dormidas registadas nas áreas não costeiras. No entanto, se a análise for feita por tipologia de empreendimento, verifica-se que as unidades de Turismo no Espaço Rural e Turismo de Habitação registam 68,3% das dormidas nas zonas não costeiras de Portugal (Estatísticas do Turismo 2019, INE, 2020). O interior do país ainda é um território não saturado, com potencial para o desenvolvimento de um turismo de qualidade, sustentável e não-massificado. Numa fase em que são desaconselhados os grandes ajuntamentos e aglomerados, o “turismo de confinamento” pode surgir como uma solução que satisfaz todos os intervenientes.
A abertura dos corredores aéreos para a Europa e outros destinos é determinante para aumentar a entrada de turistas estrangeiros que, tradicionalmente, nos meses de outubro a maio diversificam os motivos das suas viagens. Diminui o turismo de sol e mar e, no seu lugar, aumentam outros segmentos como turismo cultural, turismo de natureza ou negócios.
Na Estratégia para o turismo 2027 foram estabelecidas metas, entre as quais aumentar a procura turística nas várias regiões e reduzir o índice de sazonalidade. Foram ainda definidos como ativos estratégicos a Gastronomia e Vinhos e Saúde e bem-estar. Portugal tem uma gastronomia tradicional muito rica, 1860 km de costa, que proporciona dos melhores peixes do mundo, para além da qualidade da restauração e de chefes reconhecidos internacionalmente. Os tão premiados vinhos portugueses são um dos pontos de partida para o Enoturismo. Portugal dispõe ainda de uma elevada concentração de nascentes de água com indicações terapêuticas e outros centros especializados em saúde e bem-estar, aliando as práticas de vida saudável, mindfullness e natureza.
Do castanho ao cerejo, mais do que nunca, é o momento para descobrir o equilíbrio, para quebrar as rotinas, para usufruir do que é bom e faz bem, para valorizar os momentos com aqueles que fazem parte do nosso nicho familiar.
- Inicie sessão ou registe-se para publicar comentários