Hidrogénio verde: atrair investidores através de uma abordagem ecossistémica;

Hidrogénio verde: atrair investidores através de uma abordagem ecossistémica
A União Europeia pretende produzir 10 milhões de toneladas de hidrogénio verde, por ano, até 2030, como parte dos seus planos para resolver o problema de segurança energética e acelerar a descarbonização. O hidrogénio verde poderá constituir o fio condutor do futuro ecossistema integrado de energia verde da Europa, graças à sua capacidade de armazenar e fazer circular o excedente de energia renovável proveniente de múltiplas fontes, em toda a economia. Poderá fornecer calor e eletricidade combinados e, simultaneamente, descarbonizar as indústrias mais desafiantes, os transportes pesados, a produção de eletricidade e os edifícios.
Portugal dispõe de duas vantagens fundamentais que o tornam o candidato ideal para a produção de hidrogénio verde. Em primeiro lugar, detém recursos energéticos renováveis abundantes, com um potencial significativo de energia solar e eólica que pode ser canalizado para a produção de hidrogénio verde. Adicionalmente, a sua localização estratégica na Península Ibérica posiciona-o como uma “porta de entrada” para o mercado europeu, apresentando grandes oportunidades de exportação. Com estas condições favoráveis, firmemente estabelecidas, Portugal encontra-se posicionado para assumir um papel substancial e influente no setor em expansão do hidrogénio verde.
No entanto, a variedade de fontes de energia renováveis, especialidades e segmentos de clientes necessários para o hidrogénio verde, implica a integração de indústrias anteriormente separadas, desde as energias renováveis até aos transportes e à indústria. Isto não seria possível sem uma coordenação regulamentar sem precedentes e uma colaboração intersectorial em todo o ecossistema, com o propósito de criar um caso de negócio para o investimento.
 
Desafios a enfrentar
A produção de 10 milhões de toneladas de hidrogénio verde por ano exigirá até 210 GW de capacidade adicional de energias renováveis e 80-100 GW de capacidade de eletrolisadores, em comparação com os atuais 160 MW. Serão, por isso, necessários 471 mil milhões de euros de investimento para construir a infraestrutura necessária, desde condutas a instalações de armazenamento. Atrair o investimento necessário é um desafio para uma indústria emergente com elevados custos de produção, fontes de energia e procura por parte dos clientes.
A União Europeia tem uma vasta e complexa gama de normas e organizações para o hidrogénio que regem tudo: desde a segurança à qualidade. O trabalhar em colaboração é essencial para desenvolver as infra-estruturas necessárias para melhorar a eficiência da produção e impulsionar a procura, em especial no que diz respeito aos ativos conexos, como os projetos de energias renováveis, os eletrolisadores e as redes elétricas. Isto também será necessário para os veículos a hidrogénio e para as redes de reabasteciento. O desafio reside no facto de ainda não termos assistido a uma aceitação maciça das recentes aprendizagens em todo o setor, de modo a permitir a replicação à escala industrial em toda a cadeia de valor. Isto deve-se, em parte, à relativa imaturidade do setor.
A fragmentação da cadeia de valor do hidrogénio está a aumentar os custos, os riscos e os obstáculos para os investidores. É imperativo que a convergência de conhecimentos e normas forneça uma referência universal para as melhores práticas e condições de concorrência equitativas para todos os projetos. Precisamos também de colaboração internacional entre indústrias anteriormente separadas, desde as energias renováveis e os eletrolisadores, até aos fertilizantes e à eletricidade, para criar hidrogénio e energias renováveis a preços acessíveis e criar um mercado para o produto.
 
Conectar o ecossistema do hidrogénio
A fim de descarbonizar indústrias mais complexas, a EIT InnoEnergy fundou o Centro Europeu de Aceleração do Hidrogénio Verde (EGHAC). Com uma abordagem única na cadeia de valor, este centro reúne todas as partes interessadas, incluindo o comprador e os acionistas de uma nova empresa. Deste modo, os riscos e os benefícios podem ser partilhados para manter o prémio verde para o produto final descarbonizado a um nível mínimo, tornando estes empreendimentos financiáveis, abrindo caminho para um futuro promissor.
O EGHAC reuniu fundadores de renome mundial para criar uma empresa sustentável de ferro reduzido direto, a GravitHy. A empresa nasceu da cooperação intersectorial, que envolveu intervenientes da indústria juntamente com a EIT InnoEnergy. A empresa tem como objetivo atrair 2,2 mil milhões de euros de investimento global para uma nova fábrica de ferro e aço ecológico que poderá criar 3.000 postos de trabalho. Este projeto ilustra a forma como a união da cadeia de valor industrial de ponta a ponta pode reduzir o risco de grandes investimentos em novas empresas de hidrogénio verde.
Outro projeto industrial recente do EGHAC é a FertigHy, uma empresa inovadora que tem como missão revolucionar a transição para a indústria europeia de fertilizantes com baixas emissões de carbono. Fundada por um consórcio de investidores influentes, incluindo a EIT InnoEnergy, a RIC Energy, a MAIRE, a Siemens Financial Services, a InVivo e a HEINEKEN, a FertigHy tem como objetivo produzir fertilizantes rentáveis e ambientalmente sustentáveis para os agricultores europeus. Centrando-se na eletricidade renovável e no hidrogénio verde, a empresa planeia construir e operar vários projetos de fertilizantes com baixo teor de carbono, em grande escala, por toda a Europa. A sua primeira fábrica, cuja construção está prevista para 2025, produzirá anualmente mais de um milhão de toneladas métricas de fertilizantes à base de azoto com baixo teor de carbono. A visão da FertigHy também se alinha com os esforços da Comissão Europeia para a transição para fertilizantes com baixo teor de carbono e aborda os desafios prementes da segurança alimentar e das interrupções na cadeia de abastecimento.
 
Construir o futuro do hidrogénio verde na Europa
O hidrogénio verde poderá constituir o pilar central da futura economia verde, com a sua capacidade de produzir calor e energia limpos, descarbonizar simultaneamente os setores mais difíceis de reduzir emissões e fornecer uma capacidade de armazenamento renovável em grande escala. No entanto, menos de 0,3 milhões de toneladas são atualmente produzidas na União Europeia e a sua expansão para 10 milhões de toneladas anuais exigirá uma vaga de investimentos. Os elevados custos de produção das energias renováveis e do hidrogénio, a fragmentação da cadeia de valor do hidrogénio e a falta de mercados estabelecidos para o produto, estão atualmente a aumentar o custo e o risco para os investidores.
A coordenação de normas em vários setores é também essencial. As Garantias de Origem para o hidrogénio verde foram lançadas em toda a Europa e, no início de 2023, a União Europeia adotou regras universais para definir formalmente o hidrogénio renovável e uma metodologia para calcular as emissões do ciclo de vida.
Uma vez que o hidrogénio verde requer uma mistura de fontes de energia renovável, desde a solar à eólica, e de especialidades, desde o eletrolisador à água, existe uma oportunidade de combinar recursos ao longo da cadeia de valor para criar um caso de negócio cumulativo para os investidores. Torna-se, por isso, necessário conseguircustos combinados eficientes e oportunidades de mercado através de vários fatores, desde clusters industriais e consórcios intersetoriais, a projetos de co-localização de hidrogénio e acoplamento setorial. Em última análise, isto também irá ajudar a concretizar a visão de um sistema energético integrado em toda a Europa, com fontes de energia verde combinadas para vários setores.

Andreia dos Santos Fernandes, Portugal Country Manager da EIT InnoEnergy

18/04/2024
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